Thursday, August 04, 2016

Aprender para quê?

Nos últimos dez anos venho passando por uma série de despertares. Primeiro eu comecei a me incomodar com o lixo, comecei a enxergar que a quantidade de lixo nas ruas, casas e comércios não caberiam nas cidades, que tudo aquilo vai para um lixão onde vai ficar eternamente. Depois eu despertei para a questão da alimentação, fui vegetariana por anos, participei de feiras agroecológicas, plantei algumas hortas e até hoje busco plantar o máximo que posso, evito carne e prefiro produtos naturais e orgânicos, na medida do possível, pois são muito caros. Despertei também a respeito da minha paixão por trabalhar com crianças e Educação.  

Nessa série de insights eu me vali de várias teorias, filosofias, pesquisas, conversas com amigos, reflexões e, sobretudo, da constante experiência de conhecer projetos, trabalhar, pesquisar, viver, como um ciclo constante que retroalimenta o ser, faz agir e pensar. A experiência prática é onde busco conexões entre as várias sabedorias, porém vejo que a presença é um alinhamento com o ser sensível e instintivo com o nosso ser cultural e transcendental. Aprendi que tudo é um momento vivo, o agora é a constante troca do nosso organismo com o ambiente.

Digo isso porque, em meu atual momento, estou aprendendo que em Educação, muitas vezes, somos extremamente e distraidamente moralistas. Para transformar isso precisamos estar dispostos a enxergar as raízes dos nossos valores e princípios, perceber os significados de nossas ações. Ao mesmo tempo em que buscamos formas de transformar, vamos buscando estratégias de conciliar o mundo que temos com o mundo que queremos ter, com as coisas que queremos transformar. Ao mesmo tempo que eu percebo que é fundamental e essencial deixar a criança livre para viver por si suas experiências de aprendizado, reconheço o valor da sistematização e registros do processo de aprendizagem. Ao mesmo tempo que é bom contar uma história sem expressar juízos e assim deixar a criança livre para interpretar, é bom também expressar as emoções.

Vou compreendendo que a atitude do educador é de se permitir estar em dois mundos ao mesmo tempo: o mundo que identifica em si padrões opressores e ressignifica o fenômeno da Educação e o mundo que constrói a si mesmo. Através da cultura podemos preservar o bom do passado e transforma os padrões do antigo paradigma para ações democráticas, ecológicas, comunitárias, autônomas.

O despertar, muitas vezes, nos leva ao extremo de uma ideia, de uma percepção. Isso aconteceu comigo em vários momentos. Hoje eu procuro conciliar os diversos mundos, o estar presente no agora e a atitude de não fazer juízos desnecessários, ficar mais atenta aos meus “moralismos”, pois estes são ideias estigmatizadas socialmente que, na maioria dos casos, desfavorecem a percepção sensível do momento educativo, da experiência de enxergar cada pessoa como única, cada momento como único, uma ação pedagógica encarnada na presença, na sensibilidade e na escuta sensível. O julgamento moral nos impede perceber o fenômeno em si, o que é fundamental para ser possível desenvolver uma Educação que respeita o tempo e a forma de aprender de cada um, que considera os sonhos e os desejos da criança na construção do roteiro de aprendizagem dos educandos.

Percebo que definir valores e segui-los é construir princípios éticos e aprendizados, e isso é fundamental em Educação, contudo, isso não pode ser cristalizado, não pode ser ortodoxo, eis que a Educação é o espaço para a diversidade, para aprender a ouvir, a dialogar, a fazer escolhas e respeitar as escolhas dos outros, ainda que isso seja diferente daquilo que queremos. Para que possamos levar os nossos aprendizados pedagógicos em direção ao futuro, é preciso que isso seja flexível, capaz de sincronizar com as surpresas e emergências da vida. Abrir mão de alguns julgamentos morais nos ajuda a perceber as coisas de forma mais dinâmica e viva, abandonamos algumas certezas, honramos algumas sabedorias, mas temos conscientes que estamos construindo a realidade a todo momentos, constantemente, permanentemente, em movimento.

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